segunda-feira

Presente de Grego





- Feijoada.
- Feijoada, Mira? Pega leve! Se fosse um churrasco, ou um pequeno buffet, como fizemos no ano passado... Mas, feijoada?
- É isso mesmo, Beta. Vou fazer uma feijoada pra comemorar meu aniversário. Tô afim... Posso?
- Bem, não vai adiantar mesmo eu dizer qualquer coisa, né? Você já decidiu. Você é quem sabe, o aniversário é seu.
- Então, tá fechado! Vai ser feijoada.

Os aniversários de Mira são sempre comemorados em sua casa de praia, que tem uma cara de sítio. Por isso, tudo acontece ao ar livre. Muito vinho, muita cerveja, muito violeiro, muita alegria que, afinal, é o aniversário da Mira, gente!
Todos os anos, no dia anterior, ela e dona Elza, a "secretária doméstica" já estão lá, a preparar os comes, que os bebes vão chegando à medida em que chegam os convidados.

Como sempre, Mira e Beta estão animadíssimas para a festa, exceto por um detalhe. Estavam com um dos sobrinhos em casa. E o menino era bem sobrinho da Mira. Não era mole não!

As irmãs tinham na casa de praia alguns animaizinhos de pequeno porte como coelhos, hamsters e porquinhos-da-índia, tartarugas, todos soltos, pela propriedade. O garoto botava a bicharada em polvorosa, o que deixava Mira enlouquecida. Vez por outra, estavam as duas esticadas na rede, sob as acácias, e lá vinha a bicharada correndo em disparada com o pestinha atrás, uma tartaruguinha debaixo de cada sovaco, morrendo de rir.

- Deixe os meus bichos em paz, ó peste!
Beta, embora adore crianças e ame de paixão o sobrinho, sucumbia o tempo todo:
- Esse garoto parece que tem o diabo no corpo!

A preocupação com a presença de Albertinho justo na festa de aniversário de Mira enraizava-se na quantidade de vezes que ele já havia aprontado para as duas, de outras vezes que viera do nordeste para passar férias de verão ou feriados prolongados com as tias.

Só para ilustrar, certa ocasião, Mira, sabendo que o danadinho ia chegar e vendo sua mini plantação de tomates explodindo em frutos saudáveis e apetitosos, necessitando de apenas mais dois ou três dias para serem colhidos, juntou-se à Beta e dona Elza e passaram uma manhã ensacando os frutinhos nos pés, como a proteger-lhes de uma poderosa praga. Quando terminaram, os tomateiros mais pareciam instalação de bienal.

- Eu acho que assim é que vai chamar mais a atenção do Albertinho.
- Deixa comigo, Beta, que eu vou contar uma história bem horripilante pra ele não passar nem perto.
- Só quero ver...

Quando o menino chegou, - moreninho, olhos vivos, inquieto, as mãos sempre procurando o que segurar, explorar, destruir -, Mira levou-o até os tomateiros.

- Olha, meu querido, a tia só quer que você fique bem longe daqui, viu?
- Que arvorezinhas engraçadas, tia...
- Engraçadas e perigosíssimas...
- Nasceram aí esses saquinhos, tia? Eu nunca vi um pé de pacotinhos...
- É claro que não, Albertinho. Os frutos estão dentro dos pacotinhos, junto com umas coisinhas que eu e a tia Beta colocamos...
- Foi o quê que as tias colocaram dentro?
Mira, psicologia infantil de botequim:
- Veneno. Poderoso! A tia teve que encher os tomatinhos de veneno pra ver se consegue exterminar os bichos que estavam comendo os frutos, e depois cobri-los com esses saquinhos.
- Hummmmmm!
- Você entendeu direitinho?
- An-ran! -, fez o Albertinho, ar compenetradíssimo.

Dois dias depois, Mira e Beta foram até lá para, finalmente, colher os tomatinhos. Ao chegarem, Mira respirava aliviada.

- Viu? Deu certo. Tá tudo como nós deixamos.
- Nossa! Inacreditável.

Dona Elza já chegava com um grande vasilhame e as moças se preparavam para colher as frutinhas. Qual não foi a surpresa ao soltarem os barbantinhos que amarravam aos galhos os pacotinhos... Eram só isto: pacotinhos. Não havia um único tomate para contar história. Beta não conseguia se conter e ria a mais não poder. Dona Elza disfarçava, mas também estava se divertindo. Só a Mira não relaxava de jeito nenhum.

- Que moleque danadinho! Eu vou dar uns piparotes nesse sem-vergonha...

A lembrança de travessuras como essa, infestava-lhes de pulgas as orelhas. Enfim, um ano se passara desde a última estripulia, e Albertinho, quem sabe, estaria mais amadurecido...

- Deus é grande! - sonhava Roberta.

A festa foi aquele sucesso de sempre. Roberta contou cerca de 80 pessoas entre os amigos e os amigos dos amigos que sempre vinham a reboque. Os violeiros movidos à alcóol se revezando, tocando sem parar para um coro ébrios, vozes pastosas, nem sempre afinadas, mas ávidas pelas de canções do Chico, do Djavan, da Fátima Guedes, do Tom e do Vinícius, do Vandré, do sêo Adoniran, da Violeta Parra, - um êxtase interrompido apenas quando Albertinho passava correndo (por entre os convidados) com os ratos domésticos, os coelhos, a Chiquinha, as mulheres estranhas à casa a gritar de nervoso, e a tartaruga sempre ensovacada.

Eu disse "a tartaruga"? Mas não eram duas?

Eram sim. A outra foi retirada de dentro de um dos panelões de feijoada, pretinha da silva, por uma amiga do João que viera junto, - lindos olhos azuis esbugalhados de susto.

Dois dias depois Mira "deportou" Albertinho com um bilhete para a irmã.

Déia:
Estou pensando em conhecer a China nas próximas férias de verão. Nas de inverno, talvez, a Tailândia. Beta manda avisar que vai junto. Nossos feriados também estão todos comprometidos. Com o trabalho e pequenas viagens com a turma. Infelizmente não poderemos receber o Albertinho por um bom tempo. Beijos pra mãinha, maninho e você. Mira



ju rigoni

(foto obtida em http://www.dlh.lahora.com.ec/)



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