sábado

Um Zôo Nem Tão Lógico Assim...




Mira não desgosta de animais. Prefere-os em seu habitat natural. O único bichinho de estimação que teve até hoje, além dos miquinhos, tartarugas e hamsters que simplesmente apareceram em seu sítio, foi a Chiquinha, a poodle histérica. Seu irmão, não. Desde criança, o negócio dele era trazer todo bicho que encontrava na rua para casa.

Quando ela tinha quatorze anos, era obrigada a dividir o jardim e o quintal de casa com dois cães, um gato, três porquinhos da índia, dois passarinhos, peixinhos no lago, uma tartaruga, um papagaio, um casal de coelhos de olhos bem vermelhinhos, e um sapo que o irmão afirmava ser da espécie dendrobata. Imagine! Se era, ou não, Mira nunca soube dizer, mas era um sapão bem feio...

Entrar e sair de casa era para ela um desafio. Um evento! Sempre tinha que olhar muito bem onde pisava. Durante as visitas, seu avô, que andava se arrastando apoiado numa bengala, já havia tropeçado umas três vezes na tartaruga. A avó quase pisou no sapo, e o susto foi tão grande que a pressão explodiu. Mas isso não era tudo...

Havia todo aquele cocô... Mal o jardineiro acabava de limpar, e pimba! lá estavam eles de novo enfeitando o gramado. Cocô para todos os gostos. Cocô grande, cocô médio, cocô pequeno, cocô miudinho... Era uma merda! Literalmente.

Altino era o caçula de cinco irmãos, - o xodó da casa. Eram para ele todos os mimos, todas as vontades satisfeitas. Era de dar náuseas... Às vezes, ela reclamava. Mas entrava por um ouvido e saía pelo outro; quando seu irmão veio ao mundo, com toda certeza nascera o homem da vida da sua mãe.

Um dia, chegou em casa e encontrou a mãe e o irmão confabulando em voz muito baixa. Não deu atenção, foi para o quarto cuidar das suas tarefas escolares. A tarde transcorreu em meio a algazarra da bicharada, e lá pelas 19 horas saiu do quarto para fazer um lanche. Da cozinha, percebeu que na área de serviço estava um cesto de palha, alto e bonito. Acreditou que a mãe o havia adquirido numa feira que acontecia perto de casa.

Olhou, mas não xeretou. Lanchou, voltou para o quarto, e sentou-se para ler.

Por volta das 22 horas julgou ter ouvido um gritinho da secretária doméstica. Mas, como ela era meio doidinha ignorou. "Lá está ela dando outro daqueles ataques do nada..." Ouviu, em seguida, algumas vozes alteradas, mas não se incomodou. Aquilo era uma casa de doido mesmo e ir até lá para saber o que estava acontecendo não iria mudar em absolutamente nada tal condição.

Às seis horas da manhã o despertador tocou. Estava vestindo seu uniforme quando novamente ouviu o gritinho da Aretusa. "Diacho! - pensou - Já de manhã?..." E abriu a porta do quarto para ir até à cozinha. Não foi. Levou o maior susto da sua vida. Aretusa estava caída no chão, completamente apagada, e sobre ela passeava uma cobra enoooorme, goooorda, argh! blergh!, fedoreenta, horroroooosa. Demorou um pouco para vencer a paralisia que a visão provocara. Quando conseguiu dar um passo atrás e fechar a porta do quarto parecia que o coração ia saltar pela boca. E aí, gritou... Gritou como jamais havia gritado.

A mãe e o irmão batiam à porta de tal modo que poderiam tê-la derrubado. Estava trancada e só de pensar em abri-la ela tremia inteira.

- O que está acontecendo, Mirinha? Abra esta porta!

- Tira essa cobra daí! Vocês estão completamente doidos. Num hospício, as pessoas são mais normais.

E o irmão:
- Deixa de ser histérica! É só uma jibóia. Não é cobra venenosa, não...

E a mãe:
- Então, meu bem... Ela é tão mansinha!...

- Isto quer dizer o quê, mainha? Que a senhora vai permitir essa coisa rastejante aqui dentro de casa?!

- Claro que não, Mirinha! Ela vai ficar lá no quintal, num viveiro que o seu irmão vai construir para ela.

- AAAAhhhh! Não. De jeito nenhum, mainha. Se essa coisa fica, eu saio de casa. Vou morar com a vó. A Beta não vai acreditar quando eu ligar contando esta história... E se Beta estivesse aqui em casa ela não iria permitir que a senhora deixasse Altino trazer essa coisa pra casa..

- Ô desmancha-prazeres, você precisa mesmo é de uma outra "cobra" pra largar de histeria...

- Vixe! Como você é grosso!... Tem que viver entre os irracionais mesmo...

- Ó xente, parem de discutir!

- Escute: vocês não vão socorrer a Aretusa, não? Ela vai esticar as canelas se acordar e este bicho ainda estiver aí em cima dela...

- Afe! E num é que é mesmo?! Vamos tirar ela dái. Coitada da "cobrinha". Deve estar assustada... Estressada com essa confusão.

A mãe e o irmão cessaram a discussão com Mira e trataram de socorrer a moça.

Enquanto isso, Mira saiu pela janela e ganhou a rua. Ia pedir abrigo em casa dos avós. Lá fora, estavam todos os vizinhos querendo saber o motivo de tanta gritaria.

É claro que a jibóiona fedorenta não conseguiu abrigo no solar dos Ramalho.

ju rigoni


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Um comentário:

Marcelo Novaes disse...

Mira,



Passa a ficha do meliante que eu vou denunciar para o Ibama.


Inafiançável.



;)







Beijos,








Marcelo.